DiscoverPergunta SimplesComo comunicam os bebés antes das palavras? Pedro Caldeira da Silva
Como comunicam os bebés antes das palavras? Pedro Caldeira da Silva

Como comunicam os bebés antes das palavras? Pedro Caldeira da Silva

Update: 2025-11-19
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Hoje abrimos uma porta especial: a porta para o momento em que a comunicação ainda não tem palavras. É ali, naquele segundo primordial, que tudo aquilo que somos, sentimos e esperamos cabe num olhar, num ritmo, num gesto que ninguém nos ensinou — mas que todos reconhecemos. Antes de falarmos, já comunicamos. Antes de dizermos “mamã” ou “papá”, já perguntamos: “Estás aí para mim?”


Este é um dos territórios mais fascinantes e menos compreendidos da vida humana: a comunicação dos bebés. Intuímos muita coisa. A investigação ilumina ainda mais. Mas a cada novo estudo percebemos que a comunicação nos primeiros dias de vida é infinitamente mais complexa, sofisticada e decisiva do que imaginávamos.


Para nos guiar, contamos com o olhar de Pedro Caldeira da Silva, fundador da Unidade da Primeira Infância do Hospital D. Estefânia e pioneiro da psiquiatria dos bebés em Portugal. Um clínico que passou décadas a observar esta dança silenciosa entre bebés e adultos — e que nos ajuda a ver o que tantas vezes nos escapa.




Como é que os bebés comunicam quando ainda não têm palavras?


Um tema que merece reflexão é: Como é que os bebés comunicam antes das palavras? Pedro Caldeira da Silva


A comunicação de um bebé recém-nascido não é um acaso nem um reflexo automático. É intenção. É relação. É um corpo que chama o outro.


E há sinais claros dessa comunicação precoce:



  • A imitação involuntária de expressões faciais.

  • A procura insistente do rosto humano.

  • A preferência pela voz da mãe entre todos os sons.

  • A capacidade de criar padrões rítmicos e emocionais.

  • A repetição — o primeiro esboço de diálogo.


Antes de falar, o bebé já pergunta, já espera, já testa.


E, sobretudo, já organiza emocionalmente o mundo que o recebe.




E quando um bebé não comunica? O que significa o silêncio?


Se a comunicação precoce é natural, a sua ausência levanta perguntas.


Um bebé que não procura, não repara ou não repete, pode estar a emitir um sinal tão forte quanto o choro mais intenso.


Nem todo o silêncio é igual.


Há o silêncio que acalma — e há o silêncio que preocupa.


Pedro Caldeira da Silva ajuda a distinguir:



  • O silêncio protetor: o bebé recolhe-se, mas volta.

  • O silêncio sinal: o bebé não volta, não responde, não entra no jogo relacional.


E aqui entramos num dos temas mais sensíveis da atualidade:


o aumento dos diagnósticos do espetro do autismo.


O episódio não traz alarmismo — traz clareza. O que sabemos. O que ainda não sabemos. O que precisamos de observar com atenção genuína.




Da primeira infância à adolescência: o que muda na forma de comunicar?


A conversa leva-nos num arco completo: do recém-nascido ao adolescente.


E percebemos algo essencial: a comunicação humana é um contínuo, não um salto.


O bebé imita porque precisa de relação.


A criança repete porque precisa de segurança.


O adolescente contesta porque precisa de autonomia.


E nestas fases, pais, mães e cuidadores vivem um misto de responsabilidade, dúvida, exaustão e culpa.


É por isso que o episódio fala também dos “tutores de resiliência” — figuras decisivas que surgem quando a família não chega: professores, treinadores, amigos, adultos significativos que seguram o chão emocional de uma criança.




Os ecrãs fazem mal? Ou faz mal a ausência do adulto?


Este é um dos mitos mais persistentes. E a resposta surpreende.


O problema não é o ecrã.


É o bebé que passa horas a olhar para uma televisão que não o olha.


É a criança que perde ritmo, toque, olhar e reciprocidade.


É a relação que desaparece enquanto a tecnologia ocupa o espaço.


Um ecrã nunca é prejudicial por si só.


Prejudicial é a negligência, a ausência emocional do adulto, o vazio relacional.




O tédio também comunica


Vivemos uma infância hiperorganizada: horários, atividades, vigilância constante.


E, com isso, quase eliminámos um elemento crucial: o tédio.


O tédio é fértil.


É a matéria-prima da criatividade, da descoberta, da exploração.


É onde se inventa.


É onde se cresce.


Ao retirar o tédio, retiramos à criança uma das primeiras formas de autonomia interior.




A ausência emocional: o silêncio que fere


Talvez o ponto mais duro — e mais urgente — do episódio:


a indisponibilidade emocional.


Não é ausência física.


É presença sem vínculo.


É um adulto que está, mas não responde.


Que ouve, mas não devolve.


Que vê, mas não repara.


Esse silêncio cava um buraco na criança — e as marcas chegam muitas vezes à adolescência e à idade adulta.


Falar deste tema é desconfortável, mas necessário.


Porque só nomeando podemos reparar.




Podemos reparar aquilo que falhou?


Sim.


E é uma das mensagens mais luminosas da conversa.


Mesmo quando falhou vínculo, tempo ou atenção, nada está perdido.


A experiência molda-nos, mas não nos fixa para sempre.


Basta uma relação capaz, um adulto atento, alguém com disponibilidade emocional para realinhar o caminho.


Humanamente, isto é extraordinário.


E é profundamente esperançoso.




O que fica desta conversa?


Que os bebés dizem muito antes das palavras.


Que as crianças comunicam mesmo quando não explicam.


Que os adolescentes falam mesmo quando parecem calados.


E que comunicar continua a ser uma arte de observar, responder e reparar.


No fundo, a pergunta que atravessa toda a vida — da primeira infância à idade adulta — é sempre a mesma:


“O que precisas de mim agora?”


LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO


Esta transcrição foi gerada automaticamente. Por isso, ela pode não estar totalmente precisa.

0:12

Ora, vivam bem vindos ao pergunta simples, o vosso podcast sobre comunicação?

Os abrimos uma porta rara, a porta para o momento em que a comunicação ainda não tem palavras.

Um instante em que tudo aquilo que somos, sentimos e esperamos.

Cabe num olhar, num ritmo, num gesto minúsculo que ninguém nos ensinou, mas que todos reconhecemos.

0:35

Antes de falarmos, já dizemos, muito antes de dizermos, mamã ou Papá, já perguntamos, estás aí?

Para mim, isto é um dos territórios mais fascinantes e talvez dos menos compreendidos da vida humana, a comunicação dos bebés.

0:51

Pelo menos para mim, todos intuímos algumas coisas.

Há muita investigação e há a cada passo.

Factos novos sobre a comunicação dos bebés não a fala, mas a intenção de comunicar a forma como um recém nascido convoca o adulto, cria padrões, imita expressões e constrói de forma surpreendentemente sofisticada, o seu primeiro mapa emocional do mundo.

1:13

E entramos acompanhados por alguém que passou décadas a observar esta dança invisível.

Pedro Caldeira da Silva, fundador da unidade da primeira infância do hospital dona Estefânia e pioneiro da psiquiatria dos bebés.

Ele ajuda nos.

A ver o que normalmente não vemos, o choro como mensagem, o sorriso como reforço, a imitação.

1:33

Como o pedido de relação mostra nos como um bebé antes de falar, já está a estabelecer expectativas, a construir memória e organizar o pensamento, testando se o mundo responde e porque.

A comunicação não é só técnica, é, sobretudo, vínculo.

1:50

Vamos também perceber como é que estas primeiras conversas deixam marcas.

Na forma como olhamos, na forma como escutamos, na forma como nos relacionamos mais tarde, já, adolescentes ou adultos.

Isto episódio é sobre bebés, mas também é sobre nós.

Sobre aquilo que herdamos, aquilo que aprendemos, aquilo que continuamos a tentar reparar.

2:19

É desconcertante perceber que um bebé de poucos dias já vem equipado com competências impressionantes, imitar expressões faciais, procurar um rosto, preferir a voz da mãe no meio de todos os solos do mundo, organizar padrões, criar uma espécie de música emocional interior que o ajuda a antecipar o que aí vem e, acima de tudo, comunicar ativamente antes de ter uma linguagem, uma linguagem, falar de bem entendido.

2:46

Mas.

Também é inquietante perceber o oposto, quando o bebé não procura, não repete, não repara, não responde.

O silêncio pode ser um pedido, pode ser um sinal, pode ser o início de algo que precisa de atenção.

Pedro Caldeira da Si

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