Vozes sobre a moralidade na ‘Enciclopédia’ de Diderot e d’Alembert <small>– Denis Diderot, Louis de Jaocourt - 1783 d.C.</small>
Update: 2018-09-06
Description
Da Enciclopédia, ou Dicionário razoado das ciências, das artes e dos ofícios. Paris, 1783 d.C.
Tradução: Maria das Graças de Souza. Editora Unesp. Volume 5: Sociedade e artes.
oferecimento
Honestidade (Moral)
Jaucourt [8, 287]
Honestidade é pureza de costumes, de postura e de palavras. Cícero a definia como uma sábia conduta em que as ações, as maneiras e os discursos correspondem ao que somos e ao que devemos ser. Ele não a colocava no nível dos modos, mas das virtudes e dos deveres, por ela ser um deles, fonte de exemplos da prática de todo o bem. Simples omissões nos usos aceitos do decoro, que dizem respeito apenas ao tempo, aos lugares e às pessoas, não passam de aparência da honestidade. Embora demande regularidade das ações exteriores, ela é fundada sobretudo nos sentimentos interiores da alma. Se o drapejamento na pintura produz um dos grandes ornamentos da tela, sabe-se que seu principal mérito é o de deixar entrever o nu, sem disfarçar as junções e as marcas. As vestimentas devem sempre estar de acordo com o caráter do assunto que querem imitar. Assim, a honestidade consiste 1) em nada fazer que não traga consigo o caráter da bondade, da retidão e da sinceridade, eis o ponto principal; 2) em nada fazer, mesmo que a lei natural permita ou ordene, a não ser da maneira e com as reservas prescritas pela decência. Para o que concerne à honestidade considerada no direito natural, vide Honesto.
(TK)
Humanidade (Moral)
Diderot [8, 348]
Humanidade é um sentimento de benevolência por todos os homens que somente se inflama numa alma grande e sensível. Esse nobre e sublime entusiasmo atormenta-se com os sofrimentos dos outros e a necessidade de aliviá-los; desejaria percorrer o universo para abolir a escravidão, a superstição, o vício e o mal.
Ele esconde-nos os erros de nossos semelhantes ou nos impede de sentidos. Mas nos torna severos para com os crimes: arranca das mãos do celerado a arma que seria funesta ao homem de bem. O que ele faz não é nos afastar de elos particulares, mas, ao contrário, torna-nos amigos melhores, cidadãos melhores, esposos melhores. Ele se apraz em expandir-se pela benevolência em relação aos seres que a natureza aproximou de nós. Vi essa virtude, fonte de tantas outras, em muitas cabeças e em poucos corações.
(TK)
Indecente (Gramática, Moral)
Diderot [8, 667]
Indecente, que é contra o dever, o decoro e a honestidade. Uma das principais marcas de uma bela alma é o sentimento da decência. Quando levado à extrema delicadeza, a nuance se dissemina, sobretudo sobre as ações, os discursos, os escritos, o silêncio, o gesto, a postura; dá relevo ao mérito distinto; disfarça a mediocridade; embeleza a virtude; dá graça à ignorância.
A indecência produz efeitos contrários. Perdoam-se os homens quando ela é acompanhada de uma certa originalidade de caráter, de uma alegria particular e cínica, que os coloca acima dos costumes; nas mulheres, é in¬ suportável. Uma bela mulher indecente é uma espécie de monstro, que eu me sentiria à vontade para comparar a um cordeiro feroz. Não é algo que se queira encontrar. Há profissões das quais não se ousa exigir a decência: o anatomista, o médico, a parteira, são indecentes sem consequência. É a presença das mulheres que torna a sociedade dos homens decente. Homens sozinhos são menos decentes. Mulheres são menos decentes entre si do que com os homens. Quase não há vício que não leve a alguma ação indecente. É raro que o vicioso receie parecer indecente. Acredita-se afortunado quando não tem senão essa barreira a vencer. Há uma indecência particular e doméstica; há outra geral e pública. Nós a ferimos, talvez, todas as vezes que, arrastados por um gosto imponderado pela verdade, não somos suficiente¬ mente indulgentes para com os erros públicos. O luxo de um cidadão pode se tornar indecente em tempos de calamida...
Tradução: Maria das Graças de Souza. Editora Unesp. Volume 5: Sociedade e artes.
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Honestidade (Moral)
Jaucourt [8, 287]
Honestidade é pureza de costumes, de postura e de palavras. Cícero a definia como uma sábia conduta em que as ações, as maneiras e os discursos correspondem ao que somos e ao que devemos ser. Ele não a colocava no nível dos modos, mas das virtudes e dos deveres, por ela ser um deles, fonte de exemplos da prática de todo o bem. Simples omissões nos usos aceitos do decoro, que dizem respeito apenas ao tempo, aos lugares e às pessoas, não passam de aparência da honestidade. Embora demande regularidade das ações exteriores, ela é fundada sobretudo nos sentimentos interiores da alma. Se o drapejamento na pintura produz um dos grandes ornamentos da tela, sabe-se que seu principal mérito é o de deixar entrever o nu, sem disfarçar as junções e as marcas. As vestimentas devem sempre estar de acordo com o caráter do assunto que querem imitar. Assim, a honestidade consiste 1) em nada fazer que não traga consigo o caráter da bondade, da retidão e da sinceridade, eis o ponto principal; 2) em nada fazer, mesmo que a lei natural permita ou ordene, a não ser da maneira e com as reservas prescritas pela decência. Para o que concerne à honestidade considerada no direito natural, vide Honesto.
(TK)
Humanidade (Moral)
Diderot [8, 348]
Humanidade é um sentimento de benevolência por todos os homens que somente se inflama numa alma grande e sensível. Esse nobre e sublime entusiasmo atormenta-se com os sofrimentos dos outros e a necessidade de aliviá-los; desejaria percorrer o universo para abolir a escravidão, a superstição, o vício e o mal.
Ele esconde-nos os erros de nossos semelhantes ou nos impede de sentidos. Mas nos torna severos para com os crimes: arranca das mãos do celerado a arma que seria funesta ao homem de bem. O que ele faz não é nos afastar de elos particulares, mas, ao contrário, torna-nos amigos melhores, cidadãos melhores, esposos melhores. Ele se apraz em expandir-se pela benevolência em relação aos seres que a natureza aproximou de nós. Vi essa virtude, fonte de tantas outras, em muitas cabeças e em poucos corações.
(TK)
Indecente (Gramática, Moral)
Diderot [8, 667]
Indecente, que é contra o dever, o decoro e a honestidade. Uma das principais marcas de uma bela alma é o sentimento da decência. Quando levado à extrema delicadeza, a nuance se dissemina, sobretudo sobre as ações, os discursos, os escritos, o silêncio, o gesto, a postura; dá relevo ao mérito distinto; disfarça a mediocridade; embeleza a virtude; dá graça à ignorância.
A indecência produz efeitos contrários. Perdoam-se os homens quando ela é acompanhada de uma certa originalidade de caráter, de uma alegria particular e cínica, que os coloca acima dos costumes; nas mulheres, é in¬ suportável. Uma bela mulher indecente é uma espécie de monstro, que eu me sentiria à vontade para comparar a um cordeiro feroz. Não é algo que se queira encontrar. Há profissões das quais não se ousa exigir a decência: o anatomista, o médico, a parteira, são indecentes sem consequência. É a presença das mulheres que torna a sociedade dos homens decente. Homens sozinhos são menos decentes. Mulheres são menos decentes entre si do que com os homens. Quase não há vício que não leve a alguma ação indecente. É raro que o vicioso receie parecer indecente. Acredita-se afortunado quando não tem senão essa barreira a vencer. Há uma indecência particular e doméstica; há outra geral e pública. Nós a ferimos, talvez, todas as vezes que, arrastados por um gosto imponderado pela verdade, não somos suficiente¬ mente indulgentes para com os erros públicos. O luxo de um cidadão pode se tornar indecente em tempos de calamida...
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