#186 – Água potável e saneamento: Como estamos no cumprimento do ODS6 da ONU?? - Oxigênio Podcast
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Neste episódio, discutimos como está o cumprimento do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 6, da Organização das Nações Unidas (ONU), no Brasil. O ODS 6 busca garantir a disponibilidade e a gestão sustentável da água e do saneamento para todos. Para isso, conversamos com Gesmar Rosa dos Santos e com Alesi Teixeira Mendes, pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que monitoram a
evolução das metas do ODS 6. Também apresentamos o projeto Conservador das Águas, da cidade de Extrema, em Minas Gerais, que é considerado um exemplo de gestão hídrica e está sendo levado para mais de 400 municípios brasileiros.
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Roteiro
LIDIA TORRES: A Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas, a ONU, voltou ao
debate no governo Lula, depois de alguns anos na gaveta.
SONORA DE LULA: A mais ampla e mais ambiciosa ação coletiva da ONU voltada para o
desenvolvimento, a Agenda 2030, pode se transformar no seu maior fracasso. Estamos na
metade do período de implantação e ainda muito distantes das metas definidas.
MARCO CENTURION: A Agenda 2030 foi criada em 2015, em uma assembleia geral das
Nações Unidas. Lá, foram estabelecidos dezessete objetivos de desenvolvimento
sustentável que deveriam ser cumpridos pelos países até 2030. Esses objetivos são
chamados de ODS.
LIDIA: A ideia da agenda foi garantir que os 193 países-membros se comprometessem com
metas ligadas, por exemplo, à erradicação da pobreza, à garantia de educação de
qualidade e ao combate às mudanças climáticas.
MARCO: Um desses objetivos, o ODS 6, busca garantir, abre aspas: “a disponibilidade e a
gestão sustentável da água e do saneamento para todos”, fecha aspas. Ele é considerado
chave em um país como o Brasil, onde cerca de 40% das pessoas não têm acesso à rede
de coleta de esgoto e só metade dele é tratado. Isso sem considerar as diferenças gritantes
entre as regiões.
LIDIA: O tema foi abordado em julho do ano passado pelo Ministro das Cidades, Jader
Barbalho Filho, em encontro do G20 no Rio.
SONORA DE JADER BARBALHO FILHO: A necessidade de investimentos para reverter o
déficit do saneamento do Brasil é alta, estimada em aproximadamente 100 bilhões de
dólares. Se queremos alcançar as metas estabelecidas pelo ODS 6 até 2030 é
imprescindível que os países tenham em vista a necessidade da mobilização ativa de
recursos financeiros internacionais.
MARCO: Eu sou Marco Centurion, aluno do curso de Especialização em Jornalismo
Científico do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Unicamp, o Labjor.
LIDIA: E eu sou Lidia Torres, também aluna da especialização do Labjor. Neste episódio do
Oxigênio, a gente discute onde o país está no cumprimento do ODS 6.
MARCO: Faltando cinco anos para 2030, estamos perto de ter acesso equitativo à água
potável, prover saneamento para todos ou implementar gestão integrada de recursos
hídricos?
LIDIA: Para tentar entender esse cenário, a gente conversa com Gesmar Rosa dos Santos
e com Alesi Teixeira Mendes, pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada,
o Ipea. Além de monitorar o cumprimento das metas do ODS 6, eles trazem
questionamentos importantes sobre os próprios indicadores estabelecidos pela ONU.
MARCO: Depois, a gente conhece um projeto criado na cidade de Extrema, em Minas
Gerais, que é considerado um exemplo de gestão hídrica e está sendo levado para mais de
quatrocentos municípios brasileiros.
[VINHETA]
GESMAR ROSA DOS SANTOS: O ODS 6, ele tem uma importância para o Brasil, para os
países da América Latina, países da África, países da Ásia, países mais pobres que não
atingiram ainda, não alcançaram, níveis razoáveis dos serviços públicos de água,
saneamento, resíduos sólidos e drenagem urbana. O Brasil, ele iniciou de forma atrasada a
implementação da Agenda 2030.
LIDIA: Esse que você está escutando é o Gesmar Santos. Ele é um dos autores de um
relatório que o Ipea publicou em julho de 2024 para avaliar o progresso das metas do ODS
6 no Brasil.
MARCO: Apesar de a Agenda 2030 ter sido criada em 2015, só no final do ano seguinte o
governo federal criou a comissão nacional pra difundir sua implementação. Essa comissão
foi extinta em 2019, no governo Bolsonaro, e recriada no final de 2023, já no governo Lula.
GESMAR: Com a mudança de governo, em 2019, o governo deliberou claramente dois
aspectos: primeiro, optar por não levar adiante a agenda 2030, era um xingamento falar em
sustentabilidade, em ONU, em ODS. Outro item era que não se acreditava na participação
social, na cooperação, no atendimento às minorias, na expansão organizada pelo Estado.
Foi um período de quatro anos ruins em termos de gestão de água e saneamento. Se você
interrompe uma trajetória, você vai começar, não do zero, mas você vai começar com
atrasos. E é esse recomeço que nós precisamos fazer.
LIDIA: Dentro do ODS 6, existem oito metas estabelecidas pelas Nações Unidas. Entre
elas, estão: “melhorar a qualidade da água”, “aumentar a eficiência do uso da água em
todos os setores” e “implementar a gestão integrada dos recursos hídricos”.
MARCO: Das oito metas, a que mais avançamos no país foi a de “alcançar o acesso
universal e equitativo à água potável e segura para todos”. Quem fala mais sobre isso é o
pesquisador do Ipea, Alesi Teixeira Mendes.
ALESI TEIXEIRA MENDES: Em termos de domicílios para trazer, os dados do Censo
confirmaram que aqueles que estão ligados à rede, em termos de abastecimento de água,
são de quase 84% dos domicílios do país estão ligados à rede. E aqueles que não estão
ligados à rede têm outras formas de abastecimento, por nascente, por poço, e essa água
também é uma água considerada potável.
A gente percebe que o percentual médio de acesso é superior aos 90% no caso do
abastecimento de água. E é nesse sentido que a gente tem mais segurança para entender
que, com relação à água, nós temos, sim, nós conseguimos vislumbrar um caminho mais
fácil para alcançar esse acesso universal para o ODS 6.
LIDIA: A situação é bem pior quando a gente olha para a segunda meta estipulada pelas
Nações Unidas: “alcançar o acesso a saneamento e higiene adequados e equitativos para
todos, e acabar com a defecação a céu aberto, com especial atenção para as necessidades
das mulheres e meninas e daqueles em situação de vulnerabilidade”.
ALESI: Então, o nosso desafio maior continua sendo o acesso a essas instalações
sanitárias. Os dados do Censo também apresentam o nosso desafio, quase 400 mil
domicílios não têm, por exemplo, banheiro. E um número inferior em alguns estados: na
região norte a média de acesso à rede pública de esgotamento sanitário é próxima dos
20%, próxima dos 30%.
MARCO: O relatório do Ipea aponta que, em 2022, apenas 50% do esgoto gerado passou
por algum tipo de tratamento no Brasil. Há déficits regionais ainda maiores, como nas
regiões Norte e Nordeste. Outro problema é o lançamento de esgotos sem tratamento
adequado em todas as regiões e bacias hidrográficas. Uma pesquisa feita pelo Instituto
Trata Brasil estima que, no ritmo atual, a universalização do saneamento só acontecerá em
2070.
LIDIA: De acordo com o relatório, as políticas públicas no Brasil têm um histórico de prover
água, mas não sistemas de esgotamento. No meio rural, inclusive em escolas, há déficit de
equipamentos, banheiros e mesmo falta d’água, o que afeta o desempenho dos estudantes.
O Alesi comentou que diferentes ações deveriam ser prioritárias quando o tema é política
pública de saneamento.
ALESI: Eu diria que são muitas coisas. Inicialmente, eu ficaria tentado a dizer que seria
obter recursos. Só que nos últimos anos nós temos visto uma mobilização muito grande no
país em termos de aumentar as nossas alternativas de financiamento para o serviço de
saneamento.
Então eu diria que agora o nosso desafio é maior. Deveria então, na minha percepção, se
conseguir estruturar um Estado forte nesse sentido. Seria nós termos uma regulação que é
muito eficiente para conseguir garantir que o serviço seja prestado com níveis adequados,
respeitando determinados padrões de qualidade e garantindo que esses recursos que estão
chegando sejam bem alocados, que aqueles que se tornaram delegatários das concessões
prestem um serviço de forma eficiente, sem onerar o usuário, atendendo as áreas mais
necessitadas e, ao mesmo tempo, aqueles serviços que estão sob responsabilidade do
titular que é um ente público, que esse serviço seja prestado com padrões mínimos de
qualidade.
MARCO: Já o Gesmar disse que as políticas públicas deveriam garantir, prioritariamente, o
subsídio cruzado. Ou seja, cobrar preços diferentes por produtos ou serviços parecidos.
Assim, o lucro obtido com um segmento é usado para cobrir perdas com outro.
GESMAR: O que significa isso? É que um município pode ajudar o outro e os cidadãos que
têm maior renda pagam um pouco mais pela água e quem tem menor renda paga menos
pela água. Por que esse raciocínio? A água vem de um rio. Então, a água vem pura, o
município rico pega essa água, devolve tratada ou não, historicamente sem tratar, e o
município pobre lá na frente pega a água com mais dificuldade de tratar; ou lá em cima da
serra, o município pobre não poluiu tudo, então a água vai mais limpa para baixo, para o
município grande. Então, só tem