ALTERNATIVAS ÀS TAXAS MODERADORAS
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As taxas moderadoras no acesso à saúde existem há alguns anos. Demoraram um pouco mais a chegar aos Açores, fruto da resistência do Governo Regional e da Assembleia Legislativa Regional, mas lá acabaram por chegar. Ao longo dos últimos anos, o âmbito de aplicação começou a ser reduzido, e abrangiam já pouca gente e em poucas circunstâncias. Também no Serviço Nacional de Saúde deixarão de ser pagas as taxas moderadoras em moldes semelhantes aos que foram aprovados para os Açores, a partir de 2020. As taxas tinham a intenção de reduzir as idas desnecessárias aos serviços de saúde, sobretudo mas não só, nos casos das falsas urgências (ou seja, no recurso excessivo das urgências hospitalares para situações não urgentes). Houve várias tentativas de moderar estes abusos, inclusive a introdução da triagem de Manchester, para permitir dar prioridade às reais urgências.
Até agora, aparentemente nada disto resultou. Os dados regionais, referentes ao Serviço Regional de Saúde, indicam que cerca de 60% das pulseiras atribuídas através da triagem de Manchester eram azuis ou verdes, ou seja, não urgentes. A nível nacional os números eram mais baixos, mais perto dos 40% com base em dados de 2014, mas muito significativos na mesma.
A moderação do uso indevido das urgências hospitalares é uma situação que urge ser resolvida, pois acarreta enormes encargos para o serviço público de saúde, nacional e regional, que não se limitam ao desperdício económico, ocupando recursos clínicos indevidamente. O desafio é como reduzir estes abusos das idas ao serviço de saúde desnecessárias.
Há sempre a opção de cobrar os atos clínicos ao seu custo real ao utente. Esta solução reduz logo o uso abusivo dos atos clínicos desnecessários e também as falsas urgências. No entanto, tem dois problemas no quadro atual em Portugal. Primeiro, faz com que a saúde seja uma coisa de ricos. Apenas os utentes que têm ADSE, seguros ou uma riqueza muito acima da média, podem pagar os custos reais dos atos clínicos. Segundo, não restringe forçosamente os abusos, apenas encarecendo-os e tornando-os acessíveis a poucos.
Existem algumas razões para explicar o porquê de muita gente recorrer às urgências falsas para tratar da saúde. Uma, é precisamente o facto de não haver custo ou penalização para isso, só que as taxas moderadoras também não resolvem a situação, pois as isenções são tão abrangentes e o preço cobrado ao utente que efetivamente paga, tão baixo, que tornam a suposta moderação ineficaz. A segunda razão é que, bastas vezes, não existem alternativas em determinadas horas do dia. Em várias localidades, pelo menos na realidade regional, não existem serviços de atendimento permanente não urgente. Ou horários alargados para consultas de especialidade não urgentes. Se numa localidade o centro de saúde fecha às 20 horas e há uma situação que requer atenção clinica, mas não necessariamente urgente, das duas, uma: ou o utente espera até de manhã, ou recorre ao serviço de urgência. A terceira razão é que os utentes não sabem, na maior parte das vezes, distinguir se o seu caso pode esperar até aos serviços não urgentes abrirem …
Tem havido tentativas, através do recurso às linhas telefónicas de saúde e outros meios de informação, para encaminharem os doentes devidamente, só que não parecem ter o sucesso desejado. Outras alternativas, como centros de saúde com atendimento permanente ou fora de horários diurnos, não têm tido o efeito desejado. Alguns hospitais privados resolveram parte do problema das falsas urgências encarecendo os seus atendimentos no horário noturno, mas mantendo-os acessíveis durante o horário de expediente diurno.
Não há uma solução fácil para equilibrar a vertente social que o Estado quer fazer com os serviços de saúde e manter a sua eficácia e eficiência, reduzindo as falsas urgências e as falsas necessidades que levam à utilização abusiva dos serviços disponibilizados. É da maior importância encontrar uma solução política, pois da forma com as coisas estão não satisfazem ninguém: nem os utentes; nem os profissionais; nem o Estado, que tem elevados prejuízos e ineficiências no sistema.
17/12/2019
Nuno Melo Alves