Ascensão da ultradireita na Europa
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No episódio desta semana falamos sobre a ascensão da ultradireita na Europa. Para nos guiar nesta discussão, contamos com a participação especial de Vinícius Bivar, doutorando em História Contemporânea pela Universidade Livre de Berlim. Vinícius nos oferece uma análise profunda sobre como a ultradireita evoluiu desde a Segunda Guerra Mundial, destacando as diferentes “ondas” de crescimento deste movimento até chegarmos à fase atual. Discutimos como crises econômicas e políticas, como a crise de 2008 e a pandemia de coronavírus, foram aproveitadas por esses movimentos para ganhar relevância.
A conversa também aborda temas como a política de memória e a responsabilidade histórica, especialmente na Alemanha Oriental, e como esses fatores influenciam a popularidade da ultradireita. Exploramos exemplos concretos de países como Alemanha, França e Itália, analisando os recentes resultados das eleições para o Parlamento Europeu e o papel dos partidos de extrema-direita. Aperte o play!
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Participaram deste episódio: Filipe Mendonça e Vinícius Bivar.
Capa do episódio: AP
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Ascensão da ultradireita na Europa
Transcrição do episódio com Vinícius Bivar
[00:00:00 ] Filipe Mendonça: Seja bem-vindo e seja bem-vinda a mais uma edição do Chutando a Escada. Aqui é Filipe Mendonça e hoje vamos explorar temas fundamentais sobre a ascensão da ultradireita na Europa e as suas influências históricas. Para isso, a gente recebe aqui o Vinícius Bivar.
[00:00:15 ] Vinícius Bivar: Bom, eu sou o Vinícius Bivar, eu sou doutorando em História Contemporânea pela Universidade Livre de Berlim. Me graduei em História aqui no Brasil, na UNB, e fiz meu mestrado em Estudos Europeus Contemporâneos. Já há algum tempo me dedico ao estudo da Europa, mas focado na questão da história. Mais recentemente, desenvolvi um projeto auxiliar de olhar também para a extrema-direita e para a ultradireita contemporânea, com foco tanto na Europa, mas também, obviamente, dialogando com o Brasil.
[00:00:46 ] Filipe Mendonça: Eu recomendo que vocês fiquem até o final, porque a conversa está demais. O Vinícius vai falar sobre a ascensão da extrema-direita em países como França, Alemanha e Itália, nas recentes eleições agora para o Parlamento Europeu. Ele também menciona como esses movimentos se aproveitaram das crises econômicas e políticas para ganhar relevância, utilizando, por exemplo, temas como antimigração e islamofobia.
Vinícius vai falar para a gente um pouquinho também sobre política de memória e responsabilização do passado nazista e como isso influencia atualmente a popularidade da extrema-direita, principalmente em uma parte específica da Alemanha. Ele conta sobre a complexidade de todo o cenário eleitoral europeu, mencionando, entre outras coisas, como as eleições europeias podem funcionar como uma espécie de termômetro ou referendo de ocasião, mobilizando votos de protesto.
Também discutimos sobre a AfD, que é a Alternativa para a Alemanha, e a estratégia de normalização desses partidos, além da tensão entre o sentimento eurocético e a participação nas instituições europeias. Vale cada minuto, fique até o final. Se puder ajudar o Chutando a Escada, há um jeito muito fácil: compartilhe com seu amigo, dê cinco estrelas no seu agregador favorito, isso ajuda demais. Então, sem mais delongas, vamos para o papo. Com vocês, Vinícius Bivar, falando sobre a ascensão da ultradireita na Europa.
[00:02:33 ] Filipe Mendonça: Vamos começar pelo início. Todo mundo está falando sobre as eleições para o parlamento europeu, alguns dizendo que foi um resultado esperado, outros dizendo que foi mais ou menos esperado, com variações dependendo do país. Quando se fala de crescimento da extrema-direita, acho que está muito concentrado na França e na Alemanha, mas a Itália também teve um resultado um pouco surpreendente. É bem sabido que vocês, que estudam extrema-direita, estão falando disso já há muito tempo, que esse é um cenário preocupante, que é uma quadra histórica complicada. A bibliografia sobre o tema se divide em alguns momentos: desde a Segunda Guerra Mundial você tem um contínuo crescimento de movimentos de extrema-direita, que dependem da conjuntura e também consideram novos tipos de crise, novos tipos de comércio, e novas pressões no emprego. A extrema-direita no mundo se altera. Levantando essa bola para você, explique para a gente um pouquinho como vocês historiadores especialistas no tema, organizam esse movimento de crescimento da extrema-direita logo após a sua maior derrota, que foi a Segunda Guerra Mundial.
[00:03:54 ] Vinícius Bivar: Vamos lá, então. Essa divisão em diferentes momentos, ou diferentes ondas, como por vezes esse fenômeno é referido na literatura, acabou se popularizando na última década através dos trabalhos do politólogo neerlandês Cas Mudde. Ele é uma das pessoas que partilha dessa visão de que existem ondas, diferentes momentos de ascensão de diferentes grupos de extrema-direita ao longo da segunda metade do século XX e das primeiras duas décadas do século XXI.
O século XX teria essencialmente três momentos. Um primeiro momento vai de 1945 até 1955, que é o que ele chama de momento neofascista. São organizações essencialmente que derivam sua existência e ideologia diretamente do fascismo histórico e do nazismo, buscando revitalizar ou refundar partidos de cunho fascista e nazista, principalmente na Europa.
[00:04:52 ] Filipe Mendonça: Isso em um contexto de criminalização…
[00:04:57 ] Vinícius Bivar: Sim, entre 1945 e 1955, é um momento onde está ocorrendo, por exemplo, a política de desnazificação na Alemanha, com uma série de medidas sendo levadas a cabo na Europa, no sentido de desmantelar as organizações que fundamentaram os regimes nazistas na Europa durante a década de 30, principalmente no período entreguerras. O segundo momento seria o que o que Cas Mudde classifica como o momento do populismo de direita.
A partir daí surgem partidos como o Front National, de Jean-Marie Le Pen, que é considerado uma espécie de expoente desse momento. Esse é um período que vai de 1955 até mais ou menos 1980. Esse é o período, digamos assim, áureo da incorporação desse elemento populista à política de direita no contexto político europeu.
A partir desse momento, sobretudo entre a década de 80 e os anos 2000, temos o que seria a terceira onda da ultradireita, que é a ascensão de partidos de direita radical. Entre os exemplos que podemos citar estão os democratas suecos e o Partido da Liberdade Austríaco, que são partidos que estão ativos até hoje, assim como o Front National. Esses partidos buscaram incorporar elementos do fascismo e do nazismo histórico, mas com um verniz, de certa forma, radicalizado ou menos extremista. Abandonaram, por exemplo, o uso da violência, passaram a disputar eleições, utilizando as instituições democráticas como forma preferencial de chegada ao poder, contrastando com movimentos neofascistas que buscavam a chegada ao poder por meio da violência. Essa seria a distinção que Cas Mudde também faz entre esses diferentes movimentos.
A partir dos anos 2000 até o presente, estamos vivendo o que Cas Mudde classifica como a quarta onda da extrema-direita. Algo que começa nos anos 2000, mas que ganha for