Onde guarda as palavras o cérebro? Joaquim Ferreira
Description
O cérebro humano e o seu funcionamento.
A caixa onde guardamos as palavras, os sentimentos e os movimentos.
O cérebro enquanto caixa de comando e guardador de memórias e identidades.
O cérebro que se molda plasticamente para compensar danos, bloqueios e faltas de ar.
O cérebro do juízo e da consciência.
Da alma ou apenas como fundação biológica.
Este “podcast” entra pelo ouvido, mas é aí, desse lado, processado na sua mente.
Daqui um perguntador que quis saber tudo dos saberes do neurologista Joaquim Ferreira.
Todos vimos o momento em que o atual presidente dos Estados Unidos bloqueou num debate vital com o seu oponente.
Em pleno direto Jose Biden como que congelou.
Ficou com ar vago e focado no horizonte.
E as palavras ficaram caladas.
Todo o debate foi marcado por este momento aflitivo.
Mas já antes houve sinais de alerta.
O tropeçar na escada do avião. O ficar parado como que desligado das pessoas que estavam em volta.
Sim, o movimento ou a alteração do movimento é porta de entrada para algo que se pode estar a passar no cérebro.
Todos sabemos como acabou esta história: Joe Biden abundou a corrida eleitoral.
Este foi o pretexto inicial para gravar uma conversa com o médico, investigador e professor Joaquim Ferreira. É neurologista.
Dedica-se a estudar o mais enigmático órgão que possuímos: o cérebro.
Oportunidade para aprender sobre a maneira como faz perguntas, como observa.
Vê-se como fica encantado com a maneira como o cérebro humano se adapta.
Como o sono, o exercício e estarmos simplesmente a conviver uns com os outros nos pode proteger das temíveis doenças neurodegenerativas.
Mas onde está a fronteira entre o normal envelhecimento e algo mais sério do que o lento gastar da nossa existência?
Como um alerta: a reforma é capaz de não ser a melhor receita para quem quer manter o cérebro a vibrar. Tal como dormir mal. Ou não falar com os amigos. Ou não mexer os músculos.
Uma conversa sobre comunicação, biologia e comportamento humano.
Está tudo dentro da nossa cabeça
Da dúvida nascerá a luz.
Perguntas que se fazem seguramente dentro da cabeça para responder ao infinito mistério do funcionamento do cérebro humano.
Todas as perguntas.
Como funciona, como carrega palavras e emoções.
Como nos faz sentir um eu e não o outro.
Onde começa e acaba de ter consciência de si próprio e do outro.
Talvez esta questão da identidade seja aquela que mais me perturba nos eventos ligados ao nosso cérebro.
Em muitas das doenças neurológicas perde-se o sentido do eu e a ligação aos outros.
E nesse momento a simples pergunta “quem és tu?” ou “quem sou eu?” Deixa de ser uma dúvida existencial e passa a ser um vazio insustentável.
LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO
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JORGE CORREIA
Joaquim Ferreira, neurologista, professor de neurologia, professor e doutor de neurologia. É um estudioso desta última fronteira. Nós sabemos muita coisa sobre muitos órgãos, mas o cérebro continua a ser um grande ponto de interrogação.
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JOAQUIM FERREIRA
E esse termo estudioso é um bocadinho pomposo e diria que o professor é verdade. Actualmente o professor tem a responsabilidade de formar alunos, formar médicos. Na minha escola, na Faculdade de Medicina, tenho responsabilidades na farmacologia clínica e na neurologia e investigar muito. Imagino que quem tem um projeto académico é suposto deveria fazer uma troika com este termo Troika, troika que foi aplicado em Portugal.
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JOAQUIM FERREIRA
Noutro contexto, troca a troika para um académico, médico e ser competente quando é suposto que eu saiba fazer bem aquilo que depois vou ensinar. Depois ensino bem os meus alunos e faço investigação porque ainda tenho a veleidade de achar que esta conjugação permite me formar melhores médicos e eu próprio, no fundo, ter um conjunto de competências que me levem a fazer melhor daquilo que é suposto a quem está na academia ensinar a ver o doente de forma competente e fazer investigação clínica científica Nas áreas onde trabalho.
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JORGE CORREIA
Um perito em neurologia seguramente tem arte principal para fazer perguntas. De resto, os cientistas têm essa. Segue algum método para para fazer perguntas sobre sobre as coisas e sobre o cérebro? O que é que pergunta? Isto é curioso. É quase uma matrioshka que pergunta ao seu próprio cérebro como é que faz perguntas sobre o cérebro no geral do nosso, de toda a gente?
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JOAQUIM FERREIRA
Ser médico obriga me a fazer perguntas. Cada pessoa que eu vejo é suposto saber um bocadinho porque é que a trouxe ali. O que é que tem, o que é que aquelas coisas justificam tanto? O simples exercício da medicina é um exercício de curiosidade.
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JORGE CORREIA
Há perguntas fundamentais para se fazer um doente.
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JOAQUIM FERREIRA
A primeira pergunta tem quase a ver com o jornalismo, que é deixar gente falar da primeira pergunta numa consulta médica. O primeiro tempo é o que é que o trouxe aqui? O que é que aconteceu desde a última vez que nos encontramos? Que é, no fundo, dar um tempo para aquilo que nós somos. Discurso espontâneo não é para que as pessoas nos digam aquilo que lhes vem à cabeça.
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JOAQUIM FERREIRA
E é que é importantíssimo nós escutarmos de forma atenta. A primeira pergunta é deixar quem está do outro lado, seja doente, ou seja, uma pessoa que não tem doença nenhuma formal, mas tem uma razão que a traz a falar connosco, expressar se depois de um encadeamento de ideias aplica se à clínica. Como se aplica a ciência, como se aplica ao ensino.
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JORGE CORREIA
E isso aplica se também. Quero imaginar que, mesmo antes de fazer uma pergunta verbal ou ouvir qualquer palavra no momento em que o doente entrou ali na porta do consultório, logo aí dá para retirar informação daquilo que que aquela pessoa pode trazer Imensas coisas.
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JOAQUIM FERREIRA
Às vezes sinto me mal, pois o resto do tempo é um bocadinho teatro, porque aquele momento inicial já me deu imensas pistas sobre aquilo que vou decidir depois.
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JORGE CORREIA
Já um clique.
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JOAQUIM FERREIRA
Imenso dentro da neurologia, de como uma área que se chamam doenças do movimento. O que é que são as doenças de movimento? Que nomes de doenças devem ser Parkinson, tremor, doença, que não são, doenças, que dão uma lentificação do movimento ou geram movimentos anormais. Curiosamente, o jornal científico desta área, os artigos científicos vêm em papel, agora em formato digital, mas também têm vídeos, Ou seja, a forma de nós ensinarmos e de falarmos com os nossos colegas e explicarmos aquilo que vimos e mostrando vídeos em que é reportado o tal movimento normal.
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JORGE CORREIA
Portanto, há uma interpretação no fundo do movimento.
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JOAQUIM FERREIRA
É muito curioso que antes da pandemia tinha previsto dar uma aula a alunos internacionais de várias escolas médicas em que o tema era fazermos diagnósticos só por vermos os doentes andar melhor e fazer diagnósticos para vermos as pessoas andar.
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JORGE CORREIA
Como é que esse início.
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JOAQUIM FERREIRA
Tinha previsto e tinha previsto? Não foi nada. Portanto, eu estou aqui a confessar algo que tinha planeado e que acabou por não acontecer e que também tem a sua graça, que era a minha ideia aplicar nos alunos alunos internacionais. Era um congresso médico Internacional para alunos de Medicina, organizado pelos alunos da minha escola médica da Faculdade de Medicina e ala que eu tinha previsto pegar nos alunos, irmos para o metro, sentarmo nos e vermos as pessoas passarem por nós, caminharem e em função do tipo de andar, das alterações de marcha, da forma como caminhamos, nós aprendemos imenso sobre, no fundo, o estado de saúde das pessoas se não estiverem saudáveis, sobre a doença que gera
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JOAQUIM FERREIRA
uma marcha que pode estar um bocadinho alterada, tem o mérito de que, como eu depois não ia falar com as pessoas, não e nunca confirmaria o diagnóstico. Portanto, que eu brigava com os alunos sem ter um fundo de verificação. Depois, se a minha hipótese não bate certo, mas sim, eu vou esperar todos os meus doentes à porta ou até fora da porta, porque muitas vezes têm que os ajudar a entrar, porque eles caminham de uma forma lenta a forma, a temperatura da mão.
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JOAQUIM FERREIRA
Quando damos um aperto de mão, ensinamos imensas coisas. O som que produzimos quando caminhamos no fundo do arrastar de um pé no chão porque temos dificuldade de mover uma perna dá nos imensa informação, portanto. Sim, a não ser que esteja muito cansada, não esteja em forma, também nós estamos em forma. Fomos parar todos os meus doentes à porta e acompanho os e estou atento a tudo aquilo que resulta do contacto verbal, da marcha, do movimento, da temperatura da pele.
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JORGE CORREIA
Lembro me agora. Tive um vislumbre da minha aldeia, da aldeia dos meus avós, de uma expressão que se usava, que é está tão velho